sexta-feira, 30 de novembro de 2007

O dilema entre livros e filmes

Sou apaixonado, assim como tu, por literatura e cinema. Por isso achei ótimo o artigo a respeito publicado no New York Times, por Rachel Donadio, escritora e editora. A ele:

Chegou a temporada dos concorrentes ao Oscar e os multiplexes estão lotados de adaptações literárias, inclusive as versões dos Irmãos Coen para "No Country for Old Men", de Cormac McCarthy, e de Mike Newell para "Amor no Tempo do Cólera", de Gabriel García Márquez. Ainda para este ano, estão programados os lançamentos de "Atonement", de Ian McEwan, "The Golden Compass", de Philip Pullman e "Persepolis", de Marjane Satrapi.

Escritores de livros têm rumado para o Oeste em busca de fama e fortuna desde os tempos de Hemingway e Fitzgerald e livros têm há muito inspirado filmes. Mas atualmente, algumas editoras estão indo diretamente para a indústria do cinema. No mês passado, HarperCollins, uma divisão da News Corp., anunciou uma parceria com a Sharp Independent para produzir filmes baseados nos livros lançados pela HarperCollins. Ao mesmo tempo, a Random House Inc. se uniu à Focus Features para co-produzir entre dois e três filmes por ano baseados em alguns de seus livros de ficção ou não-ficção. A primeira colaboração desse tipo foi o filme "Reservation Road", em cartaz nos Estados Unidos, dirigido por Terry George e baseado no romance que John Burnham Schwartz lançou em 1998.

Essas parcerias dão às editoras uma participação maior no negócio do que os tradicionais acordos de cessão de direitos, que normalmente dão a elas pouco mais do que publicidade para o lançamento conjunto de livro e filme. Agora, Random House e HarperCollins vão receber uma porção das bilheterias, além de lucros sobre DVDs e transmissão para TV e outras mídias. E os escritores vão ganhar mais poder na escolha de roteiristas, atores e diretores.

Alguns estão preocupados que esta relação cada vez mais íntima entre Hollywood e as editoras possa estar mudando as expectativas de sucesso literário - e mesmo alterando a forma como os escritores encaram o seu trabalho. Atualmente, "muitos escritores acham que seus livros não valem nada a não ser que se transformem em filmes", disse Annie Proulx em junho no Festival Literário de Capri, ao falar sobre a experiência de ter o seu conto "Brokeback Mountain" adaptado para as telas. "Eu acho que as pessoas estão escrevendo livros com um olho voltado para os cinemas", ela disse, uma evolução que ela considera "desinspirante". Mas entrevistas com diversos romancistas que trabalharam com Hollywood sugerem que a situação pode ser mais complicada e que o processo pode não ter apenas lhes dado um salário mais gordo, mas pode ter contribuído com algumas idéias a respeito de como contar suas histórias.

Romancistas e a indústria do cinema não foram sempre tão amigáveis. "Na primeira vez que eu fui a Hollywood, eu tive a sensação de que seria melhor eu não dizer que era um romancista", conta John Sayles, que publicou histórias em The Atlantic Monthly e escreveu o romance "Union Dues", que foi indicado para o National Book Award de 1978 antes de se tornar um roteirista e diretor. Além de dirigir seus próprios roteiros para filmes como "Matewan", "Lone Star" e "Honeydripper", a ser lançado em dezembro, ele escreveu cerca de 40 roteiros para outros diretores. O estúdios, Sayles aprendeu rapidamente, vêem os romancistas como "aqueles caras que reclamam depois do filme estar pronto ou que nos fazem gastar US$ 100 mil para escrever o primeiro rascunho do roteiro antes que a gente passe para um profissional que vai cuidar dele". Muitos romancistas, ele diz, "apenas pegam o dinheiro e fogem ou pegam o dinheiro e reclamam".

Atualmente, afirma Sayles, escrever ficção para ele virou apenas um "hobby", assim como um espaço para experimentação. Um romance permite muitos e diferentes pontos de vista, ele notou, enquanto num filme, há basicamente apenas três: o omnisciente ("a tomada da casa pelo lado de fora à noite"); o do protagonista ("de dentro do closet enquanto a serra elétrica corta a porta"); e do antagonista ("através da máscara de hockey"). E romances podem expandir exatamente onde filmes precisam comprimir. Agora, Sayles está escrevendo um livro que começou como um roteiro - até que ele percebeu que nunca conseguiria juntar o dinheiro necessário para produzir algo que se passa nas Filipinas durante a Guerra Hispano-americana.

Outros romancistas dizem que o trabalho para filmes deu a eles diferentes noções de possibilidades narrativas. Schwartz, que escreveu o roteiro para "Reservation Road", diz que escrever para cinema teve um efeito "desinibidor" sobre a sua ficção, inspirando ele a cortar entre cenas de uma forma "mais agressiva". Michael Ondaatje, cujo romance "The English Patient" se tornou um filme ganhador de Oscar, diz que sua própria experiência em diversos projetos de documentários lhe ensinaram sobre o poder de decisões aparentemente pequenas. "Eu reconheço quanto intrincada e microscópica é a arte de edição", afirma ele. "Você corta algo que é um vigésimo de um frame e você faz uma enorme diferença no andamendo."

Diane Johnson, cujos romances incluem "Le Divorce" e "Le Mariage", diz que o trabalho para escrever roteiros deu a ela uma noção mais forte de estrutura. Stanley Kubrick, que a contratou para escrever o script baseado no romance "The Shining", de Stephen King, era um criador de situações elaboradas. A insistência dele em "criar um estrutura antes de passar para os detalhes de uma cena combinou muito bem com o trabalho de escrever romances", ela disse. "Eu não sei ao certo se ser uma romancista ajuda no trabalho de roteirista", ela acrescenta. "Eu acho que é mais no sentido oposto."

Um contrato para um filme também ajudou a carreira de Tom Perrotta como romancista, mesmo que não do jeito que alguns detratores podem imaginar. Quando seu romance "Election" foi publicado em 1998, ele disse, "eu tive uma porção de críticas afirmando que 'ele escreveu isso para virar um filme'", uma idéia que ele considera "risível". Na verdade, ele havia escrito o livro anos antes, mas ele ficou dentro de uma gaveta até que alguém o colocou em contato com um produtor de cinema, que mostrou os originais para o diretor Alexander Payne, que comprou os direitos para filmar a história, que garantiu então a publicação do livro. Desde então, ele não tem problemas para publicar os seus romances - ou filmá-los. Ele foi o co-roteirista para o filme baseado em seu romance "Little Children" e também foi contratado para escrever a versão em roteiro do seu novo romance "The Abstinence Teacher". "Escrever roteiros", ele diz, "tem o efeito paradoxal de fazer de mim um escritor mais literário, muito mais consciente do que eu posso fazer em um romance e não posso fazer em um roteiro".

Alguns escritores, porém, insistem que ter seus romances transformados em filmes não teve influência nenhuma em seus modos de escrever. "Meu trabalho é bem resistente a ser filmado e se a indústria cinematográfica se preocupar em tentar, está ótimo para mim e indica uma certa fortitude da parte deles", diz Rick Moody, cujo romance "The Ice Storm" foi adaptado por Ang Lee. "Mas eu não penso sobre o cinema quando estou compondo romances ou contos." Mesmo que ele estivesse em contato com o diretor e produtor durante as filmagens, Moody disse que ele tentava seguir o conselho de Hemingway, que ele resume assim: "Dirija até a fronteira da Califórnia, jogue o seu livro sobre a cerca. Quando eles jogarem o dinheiro de volta, você dirige de volta para casa".

Chuck Palahniuk também diz que está feliz apenas em sentar nos fundos da sala enquanto os diretores fazem o trabalho deles. Palahniuk trabalhava como mecânico quando o seu romance de 1996 "Fight Club" foi transformado em filme pelo diretor David Fincher. "Eu apenas larguei meu emprego... por que meu telefone não parava de tocar e não podia mais trabalhar", ele contou em um e-mail. "No dia que 'Fight Club' começou a ser filmado, meu agente me mandou uma dúzia de rosas para a garagem onde eu trabalhava - isso mudou um pouco a forma como os outros mecânicos me olhavam." Em agosto, ele viajou para Nova York para acompanhar Clark Gregg nas filmagens de seu romance "Choke". "É interessante assistir às interpretações", Palahniuk disse. "Além disso, eu como o meu peso em lanches de set e me deleito durante as cenas de nus."

Em um artigo recente para Nextbook.org, Bruce Jay Friedman consolidou o que pode ser a atitude mais saudável em relação à experiência de escrever para livros ou filmes. Ele adorou "The Heartbreak Kid", adaptação feita por Neil Simon e Elaine May em 1972 para o seu conto "A Change of Plan", sobre um homem que se apaixona por outra mulher durante a lua-de-mel. "Existe pouca coisa que eu possa fazer", escreveu Friedman, "além de assistir ao filme, aceitar os elogios por tudo aquilo que for legal e negar qualquer envolvimento naquilo que não for."

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