quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

There Will Be Blood (P. T. Anderson, EUA, 2007)

Depois de provar que é um dos melhores diretor em Hollywood com menos de 40 anos com filmes urbanos e contemporâneos como Sydney (1996), Boogie Nights (1997) e Magnolia (1999), Paul Thomas Anderson se lança em um épico para contar uma parte peculiar na história norte-americana: a corrida do petróleo.

Baseado levemente no romance de Upton Sinclair, Oil!, There Will Be Blood conta essa corrida no Sul da Califórnia no final do século XIX. Mas a qualidade do roteiro é incrível quando percebemos, somado ao relato histórico, dezenas de referências bíblicas sobre inveja e ganância. Daniel Day-Lewis interpreta magistralmente Daniel Plainview, um especulador de petróleo que vai furar poços e encarna o próprio estereótipo do monstro capitalista sem escrúpulos que deseja ardentemente enriquecer na "terra das oportunidades". No deserto californiano, não há um Deus benevolente, apenas o óleo negro e a fúria pela riqueza.

A alegoria do filme é sobre o início do Século Americano. E é sobre como essa soberania de riqueza foi construída sobre os ombros de alguns homens que beiraram o fanatismo ao construir suas fortunas diante da vontade e do trabalho.

A parcela íntima do filme é composta pela relação entre Plainview e H.W. (o estreante Dillon Freasier). Surgido misteriosamente como o próprio petróleo do deserto, o garoto terá uma relação filial com Plainview, que chegará próxima de ser carinhosa. Mas detonará também o conflito entre a ganância e a culpa, a cobiça e o pecado, que assombra a trama do filme.

Essa trama de desenrola a partir do momento em que Plainview segue com H.W. para o Sul da Califórnia com o intuito de comprar novas terras para a prospecção de petróleo. As belas cenas de petróleo jorrando dos poços, destruindo as torres de perfuração e inundando a terra de negrume e riqueza trazem também a inquietação para a ignorante população local. Extremamente pobre, esse povo vê em Plainview um salvador. E esse papel será ameaçado quando Eli Sunday (Paul Dano) chega na comunidade para "espalhar a palavra de Deus".

There Will Be Blood sem dúvida é um filme mais interessante para o público norte-americano que vê um dos alicerces da construção de sua nação desmistificados cruamente. Para os brasileiros, é mais um ótimo filme de P. T. Anderson, original e incrivelmente bem realizado.

Esse filme é muito mais linear e pode parecer aos olhos da audiência menos interessante do que os anteriores de Anderson. Mas isso se deve a uma avaliação apressada. Na verdade, Anderson parece estar mais à vontade e podendo abrir mão de um exagero autoral. Todo o filme soa perfeito e bem acabado, lembrando muito Robert Altman, com quem Anderson trabalhou no último filme do grande mestre, A Prairie Home Companion (2006).

Preste atenção na grande atuação de Daniel Day-Lewis, que parece ter se apropriado da alma de Plainview, como fez em Gangs of New York (2002). E na seqüência inicial do filme, cujas imagens no deserto remetem ao começo de 2001: A Space Odyssey (1968), de Stanley Kubrick.

Um comentário:

Rubens Valente disse...

a crueza do protagonista contrasta com a grandeza épica de "giant", bela saga sobre a busca ao petróleo no início do século passado (e que um tituleiro brasileiro batizou de "assim caminha a humanidade"). nos créditos finais, anderson dedicou o filme a uma produtora executiva que morreu durante as filmagens. "giant", se não estou enganado, também foi a obra derradeira de james dean, que perdeu uma curva de estrada e não chegou a ver o filme pronto. em "giant", havia certo glamour na nova "conquista do oeste" (a primeira tinha ocorrido à custa do massacre de milhares de índios). todo o romantismo foi soterrado em "sangue negro" junto com os operários de algum buraco lamacento. de certa forma, o contraste entre os dois filmes diz muito sobre a "caminhada americana". as coisas perderam a graça, ninguém mais fala do "self made man" sem considerar que ele seja capaz de matar um irmão, um filho ou deus pelo caminho até sua "redenção" - que, no entanto, nunca vem.